27 de abril de 2009

aí vem ele. o ódio oculto no fundo dos olhos que brilham em êxtase. queria era que o mundo girasse mais depressa. queria era poder enxergar através de cada código dessa vida miserável e prolongada. roubar qualquer motivo que exista e qualquer sentido barato. barato foi o preço das ideias. que ideias? queria mesmo era apagar cada desgraçado que cruzasse o dele. eles não fazem falta, eu não faço falta nesse fim de mundo grande demais. que a morte de um é tragédia, e a de vários é só estatística.

13 de abril de 2009

dois ou três acordes tristes. aquela música não vai tocar mais.

deixei na rua de trás os meus passos e a sanidade no primeiro copo que me transbordou. a cada esquina, uma promessa de vida. o sangue que ainda corre - nem azedo nem amargo. quero me encontrar, mas me perco ainda mais quando olho para o céu lá em cima, tão grande, tão azul. antes as tuas setas que me indicavam a direção errada e me levavam pra qualquer lugar fora do meu mapa. aqui embaixo, passo tão despercebida quanto perdida nesse dia ensolarado. dia estranhamente bonito esse que é hoje. só a casa é que deve estar fria e vazia.

[o meu peito também]

3 de abril de 2009

"já que sou, o jeito é ser"

no escuro da noite é que me encontro e na claridade do fundo me escondo. não preciso de remédio, não sou responsável pela dor. no espelho, um rosto borrado. sem retoques, sem inocência, sentido. sobre os meus olhos recaíram todas as sombras que encontrei pelo caminho. não enxerguei cores, não encontrei sentimentos. andei sobre pontes tortas e trilhos sinuosos. todos me levaram ao mesmo labirinto sem fim, sem saída e sem sabor. nas paredes, escritos de uma vida remota. nos ouvidos, ian curtis sussurra, piedoso. diz que devo andar em silêncio. só não sei para onde.

20 de março de 2009

ela se irrita com o som forçado da felicidade. felicidade não tem preço porque não existe. ela não gosta da ideia inalcançável que é a verdade e acha que seu deus nunca lhe deu sinal de vida. e a morte? não se preocupa com ela. morte não é mais problema - é solução. nada faz diferença. tudo é indiferente.
ela só abre a boca para respostas curtas. curtas e indiferentes. tenta enxergar um sorriso no espelho, mas não gosta de sorrisos. sorrisos demais, abraços demais; acha as pessoas muito exageradas. dias são quentes demais e noites passam muito rápido. não possui medos - as pessoas é que a temem. não gosta das pessoas ao seu redor. tampouco gosta de pessoas. do que ela gosta? da ponta afiada que perfura suas veias ressecadas.

11 de março de 2009

porque no fim de tudo, não haverá uma frase bonita que nos faça querer continuar e nem aplausos que nos elevem. a verdade é nua, crua e engolida inteira.
porque no fim de tudo, a vida vai escorrer por entre os nossos dedos feito água e só vai acontecer lá fora feito filme que passa na tevê.
porque no fim de tudo, não haverá remédio que cure a nossa ilusão mais que perdida e sonhar com um futuro mais justo vai ser apenas distopia. e a realidade vai ser distorcida de novo, de novo, e de novo, até que não haja mais diferença entre mentira e verdade.
porque no fim de tudo, a única luz que poderemos enxergar será a última e então eu vou rezar. porque no fim de tudo, eu vou acreditar até em milagres e fé vai ser coisa sem cor. amém, amém, amém.

27 de fevereiro de 2009

de chuvas e abismos

apostei comigo mesma por quanto tempo eu aguentaria definhando aqui. teu amor é veneno eficaz que mata aos poucos. acho que já se passaram algumas horas. ou seriam dias? não sei, nem os relógios quiseram assistir ao meu suicídio lento. mas eu não me importo de estar perdida no tempo, enquanto tenho migalhas da sua carne ainda fresca para saciar a minha fome. fome de quem vive o último dia. dia ou noite?
agora pouco Deus quis falar comigo, mas eu nem dei ouvidos. não quero diálogo com ninguém. não quero ouvir ruído nenhum. só o da chuva gelada que ainda vem me fazer companhia e o riso rouco de louca que sai da minha garganta.

22 de fevereiro de 2009

pra você eu digo sim

então vamos sair gritando na inconsequência pelas ruas. arriscar a vida e ignorar o risco da perda; só teremos um ao outro. fazer da inocência perdida só para procurá-la no escuro mais tarde. deixar secar desejos no varal do pecado, como roupas que secam numa tarde ensolarada. e molhar. secar. molhar de novo. secar de novo. fazer do desconhecido conhecido. tornar possível o impossível. o que é impossível?
cortejar a nossa insanidade. derramar sangue bebível sobre o vazio branco. beber. cair na estrada do acaso à la road movie. ir até o infinito e voltar duas, três ou quantas vezes você quiser. tomar chuva gelada e gripar no dia seguinte. dormir sob o sol e amanhacer sobre a lua. desafinar seis, sete ou doze cordas mais e dançar somente ao ritmo da nossa música. tudo aquilo que a gente sempre quis. tudo e um pouco mais.

porque eu posso esperar por toda a eternidade se você não demorar demais.

21 de fevereiro de 2009

é que hoje o dia insistiu mesmo em nascer

e nasceu.

então eu pintei unhas e paredes de vermelho
vermelho do meu sangue e branco da tua palavra não dita.
agora as minhas mãos espalmadas estão sujas, belas e sujas

- e é somente por sua causa que eu odeio cada centímetro da minha pele toda vez que me perco no labirinto do teu coração.

'keep on calling me, they keep calling me'
Joy Division - Dead Souls

13 de fevereiro de 2009

fale, Leminski

já me matei faz muito tempo
me matei quando o tempo era escasso
e o que havia entre o tempo e o espaço
era o de sempre
nunca mesmo o sempre passo

morrer faz bem à vista e ao baço
melhora o ritmo do pulso
e clareia a alma
morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma

Paulo Leminski